Em ação originária
do MPF/MG, o Supremo Tribunal Federal decidiu que editais não podem
determinar que determinada pessoa é inapta ao exercício das
atribuições do cargo.
A participação de
pessoas com deficiência em concursos públicos é um
direito constitucional e não pode ser limitado pela alegação de
que as atribuições dos cargos em disputa seriam incompatíveis com
determinadas limitações físicas, decidiu o Supremo Tribunal
Federal (STF) em recurso interposto pelo Ministério Público Federal
(MPF).
A decisão foi
proferida em ação civil pública ajuizada pelo MPF em Uberlândia
(MPF/MG) há mais de 12 anos, por meio da qual se questionava edital
de concurso público aberto pela Polícia Federal para provimento dos
cargos de agente, escrivão, perito e delegado em que não havia
reserva de vagas para pessoas com deficiência.
A União justificou que
as atividades exercidas pela Polícia Federal pressupõem o pleno
domínio de todas as funções motoras e intelectuais, argumento que
foi acatado pelo juízo federal de 1ª instância ao julgar
improcedente a ação.
O Ministério Público
Federal recorreu ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região, que
manteve a sentença, ao fundamento de ser “desnecessária a reserva
de vagas para portadores de deficiência” nos concursos promovidos
pela PF, pois as atribuições dos cargos “não se coadunam com
nenhum tipo de deficiência física”.
Recursos – Convicto
de que esse entendimento divergia de jurisprudência do Supremo
Tribunal Federal, o MPF novamente recorreu ao Superior Tribunal de
Justiça (STJ) por meio de agravo de instrumento, negado, e ao
próprio STF, por meio de Recurso Extraordinário.
No STF, o Recurso
Extraordinário recebeu a relatoria da Ministra Carmen Lúcia, que,
finalmente, deu provimento aos pedidos feitos pelo Ministério
Público.
Segundo a ministra
relatora, “a obrigatoriedade da destinação de vagas em concurso
público aos portadores de necessidades especiais é expressa e
intransponível, nos termos do inc. VIII do art. 37 da Constituição
da República” e essa garantia tem a função de permitir “que
pessoas com necessidades especiais participem do mundo do trabalho e,
de forma digna, possam manter-se e ser mantenedoras daqueles que
delas dependem”.
Por isso, “A
presunção de que nenhuma das atribuições inerentes aos cargos de
natureza policial pode ser desempenhada por pessoas portadoras de uma
ou outra necessidade especial é incompatível com o ordenamento
jurídico brasileiro, marcadamente assecuratório de direitos
fundamentais voltados para a concretização da dignidade humana”.
Interesse público –
Diante do argumento de que determinadas limitações físicas
constituem obstáculo para o exercício de atribuições que exigem,
entre outros, porte de arma, precisão de movimentos e agilidade em
ações e decisões, Cármen Lúcia ressaltou que “fere
frontalmente a Constituição da República admitir-se, abstrata e
aprioristicamente, que qualquer tipo de deficiência impede o
exercício das funções inerentes aos cargos postos em concurso”.
Para o STF, se, por um
lado, é certo que determinados cargos “não podem ser
desempenhados por portadores de limitação física ou psicológica
que não disponham das condições necessárias ao pleno desempenho
das funções para as quais concorrem”, por outro, as razões desse
impedimento deverão seguir “critérios objetivos previstos em lei
e reproduzidos no edital do concurso”, conforme os “princípios
do concurso público, da legalidade, da igualdade e da
impessoalidade, visando, também, assegurar a eficácia da prestação
do serviço público e o interesse social”.
Assim, a
incompatibilidade deverá ser afirmada posteriormente “a partir do
cotejo objetivo e transparente entre as limitações/necessidades
especiais dos candidatos e as atribuições de cada qual dos cargos
oferecidos”.
A banca examinadora,
portanto, respeitando critérios previstos no respectivo edital,
“poderá declarar a inaptidão de candidatos inscritos e cujas
necessidades especiais os impossibilite do exercício das atribuições
inerentes ao cargo para o qual estiver concorrendo”.
Isso porque, segundo o
Supremo, se a Administração Pública não pode impedir uma pessoa
com deficiência de participar de um concurso público, por outro, o
desempenho do cargo também não pode ficar comprometido pela
limitação do candidato, sob pena de se ter “o interesse
particular sobrepondo-se ao interesse público, o que não é
admissível”.
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