A cada 100 trabalhadores brasileiros, 12 são servidores públicos.
A média é a mesma verificada nos demais países da América Latina,
de acordo com a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento
Econômico (OCDE). Já nos países mais desenvolvidos, o percentual
costuma ser quase o dobro – nesses locais, a média é de 21
funcionários a cada 100 empregados. Em nações como Dinamarca e
Noruega, mais de um terço da população economicamente ativa está
empregada no serviço público.
Apenas no âmbito federal, o Brasil conta com 2,2 milhões de
funcionários, 250 mil a mais que há 10 anos – alta de mais de
10%. No mesmo período, a despesa anual com esses servidores saltou
de R$ 115 bilhões para R$ 264 bilhões, um aumento de 129%. As
informações são do Boletim Estatístico de Pessoal, do Ministério
do Planejamento, Orçamento e Gestão. Já a quantidade de servidores
municipais chegou a 6,5 milhões em 2015, segundo o Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Apesar de os números absolutos impressionarem, especialistas
dizem que os dados da OCDE provam que, na comparação com os outros
países, a quantidade não pode ser considerada exorbitante. “Não
é que o Brasil tenha servidores demais. Tem uma população grande
e, consequentemente, um número expressivo de servidores públicos.
Não se pode analisar de forma descontextualizada”, explica a
professora Mônica Pinhanez, doutora em Desenvolvimento Internacional
e Políticas Públicas pelo Massachusetts Institute of Technology
(MIT). Afinal, com 204 milhões de habitantes, o país tem a quinta
maior população mundial.
“Esse dado, sozinho, não significa que tenha mais ou menos
eficiência”, pondera. A visão de que o número de funcionários
determina se uma nação é muito ou pouco desenvolvida é, nas
palavras dela, preconceituosa. “Tem que qualificar a questão, ver
que serviços são oferecidos em contrapartida. Tem, também, o fato
da economia ser mais ou menos liberal. Além disso, é importante
notar que países menos desenvolvidos, muitas vezes, dependem do
setor público para empregar a comunidade”, argumenta a professora.
Produtividade
Julgar a realidade do funcionalismo público apenas com números é
um erro comum, concorda o especialista em governança e políticas
públicas Antônio Lassance, do Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada (Ipea). “Não existe uma quantidade ideal de servidores.
Ficar com números muito baixos ou muito altos pode ser um mau sinal,
dependendo da produtividade desses servidores. Estamos longe de
números civilizados a esse respeito”, acredita o pesquisador.
Para Cláudia Passador, especialista em gestão pública da
Universidade de São Paulo (USP), não há falta de funcionários.
“Nem sobra. Tradicionalmente, não temos histórico de excesso de
servidor, de cabide de emprego. O que tem é carência de ferramentas
de gestão na estrutura dessas organizações”, afirma. “Longe de
ser um inchaço, o problema no setor público é que a administração
parou na década de 1930. Falta atualização das ferramentas, uma
reforma administrativa.”
Desequilíbrio
O que preocupa os especialistas é a desigualdade na distribuição
dos servidores em cada área. “As pessoas têm a falsa ideia de que
a falha do serviço público é de excesso de funcionários. Mas não
é”, garante Lassance. O problema não é quantitativo, mas
qualitativo, explica. Enquanto sobram funcionários em certas áreas,
como no Legislativo, faltam em serviços básicos, como saúde e
educação. “Há deficiências em várias áreas. Não porque não
haja profissionais habilitados, mas porque os salários, muitas
vezes, não são atrativos”, acredita o pesquisador.
“Alguns servidores custam muito caro, principalmente nos poderes
Legislativo e Judiciário. O chamado teto salarial do serviço
público foi completamente desmoralizado, sobretudo pelo Judiciário,
que paga três, quatro, cinco vezes o teto a alguns juízes e
desembargadores”, avalia Lassance. Segundo dados do Planejamento,
cada servidor do Judiciário custa, em média, R$ 123 mil por ano,
enquanto o gasto anual com um funcionário do poder Executivo é de
R$ 42,7 mil. No Legislativo, a diferença é ainda mais evidente: o
custo de cada servidor é, em média, R$ 153 mil por ano.
Com base nesses números, Lassance acredita que o Brasil está
dando o recado errado às pessoas que se formam nas áreas de
humanas, biologia ou matemática. “O país está dizendo “larga
disso. Vai ser consultor legislativo, auditor de um tribunal de
contas ou vá trabalhar no Judiciário. Vale mais a pena””,
argumenta.
O desequilíbrio existe tanto nos salários quanto na distribuição
de pessoal, afirma o professor Clóvis Bueno de Azevedo, do
Departamento de Gestão Pública da Escola de Administração de
Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas. “Dizer que
tem inchaço na máquina pública no Brasil é bobagem. O que temos é
uma distribuição ruim de pessoal”, afirma. Há desproporção,
segundo ele, no número de funcionários em áreas urbanas e rurais,
entre as capitais e o resto do país e entre os serviços do centro e
da periferia. “Em São Paulo, por exemplo, tem muito menos médicos
na periferia que nas regiões centrais”, pontua.
O mesmo ocorre, segundo Lassance, do Ipea, com os professores da
rede pública. Segundo relatório de uma auditoria feita pelo
Tribunal de Contas da União (TCU) em 2015, ainda há carência de
servidores em áreas importantes, como a Polícia Federal (PF), a
Polícia Rodoviária Federal (PRF) e a Receita Federal.
Para Azevedo, da FGV, o fato de cada deputado federal brasileiro
poder contar com até 25 assessores é um exemplo de falha do
sistema. “Poderíamos funcionar com 70% dos deputados que temos
atualmente e com menos assessores cada, e ter uma Câmara igualmente
representativa da população”, argumenta. Como exemplo, ele cita
os Estados Unidos, que têm cerca de uma centena de parlamentares a
menos que o Brasil.
Proposta de redução
Um projeto de lei em tramitação no Congresso visa reduzir o
número de parlamentares no país. De iniciativa do senador Jorge
Viana (PT-AC), ele reduz o número de deputados de 513 para 385 e o
de senadores de 81 para 54. Em enquete feita em fevereiro deste ano
no site do Senado, 174 mil pessoas se posicionaram a favor da
proposta – 99% dos votos. Segundo Clóvis Azevedo, da FGV, “dá
para trabalhar com muito menos gente e aproveitando o corpo de
assessores do Congresso”. Em ranking da Organização das Nações
Unidas (ONU) divulgado em 2013, o Brasil ficou em segunda posição
entre os países que pagam salários mais altos aos parlamentares.
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